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quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

Prescrição, extinção de multa

Prescrição, extinção de multa

De acordo com a lei, a multa só tem validade e pode ser cobrada num período de até cinco anos.
A prescrição é caracterizada pela extinção do direito de punir após um determinado período de tempo estabelecido por lei.
As pontuações de multas - contadas a partir da data do cometimento da infração que ocasiona a instauração do processo administrativo - de cinco anos ou mais não podem simplesmente reaparecer.

Veja abaixo:
Obs.: Se não quer ler tudo percorra o texto e leia somente as parte que estão destacadas na cor vermelha.

Conselho Estadual de Trânsito de Santa Catarina
Parecer nº 044/2006
REQUERENTE: DEINFRA
ASSUNTO: Prescrição de Multas
RELATOR: LUIZ ANTONIO DE SOUZA
Multa de trânsito – natureza administrativa – prazo prescricional – cinco anos – incidência do Decreto 20.910/32 c/c as disposições do Decreto-lei n° 4.597/42.
PARECER:

Cuida-se de consulta formulada pelo Departamento Estadual de Infraestrutura do Estado de Santa Catarina – DEINFRA, acerca da prescrição da multa administrativa das penalidades aplicadas em decorrência do cometimento de infrações de trânsito.

A incerteza do subscritor da consulta quanto ao prazo prescricional da multa decorrente de infração de trânsito é justificável, tendo em vista que a Lei n° 9.503/97, que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro, não contempla dispositivo normatizando a prescrição.
O mesmo defeito já se verificava no estatuto de trânsito precedente (Lei n° 5.108/66 – CNT). Naquela oportunidade, o Conselho Nacional de Trânsito – CONTRAN editou a Resolução n° 812/96, estabelecendo prazos prescricionais que variavam, conforme o caso, de 01 a 05 anos para a pretensão punitiva e, aplicada a penalidade, com o trânsito em julgado dos recursos cabíveis, dispunha, ainda do prazo de 01 a 05 anos para a execução da punição.


Aquela Resolução foi revogada pela Resolução n° 148/2003, por força do parágrafo único do art. 314 do CTB, ao argumento que não fora recepcionada pela ordem jurídica em vigor.
A prescrição, tanto no que diz respeito ao jus persequendi, quanto ao jus puniendi, é instituto de direito indispensável a efetivação da justiça.

É mister esclarecer que a prescrição não extingue o direito e sim a ação atribuída a um direito. Isto é, operada a prescrição, o direito fica juridicamente desprotegido, em conseqüência do não uso da ação a ele atribuída, durante um determinado tempo.
Essa lógica se explica na disposição do art. 882 do Código Civil, onde está consignada a norma segundo a qual “não se pode repetir o que se pagou para solver dívida prescrita...”.

A Constituição Federal estabelece, em seu art. 5°, XLVII, que “não haverá pena de caráter perpétuo”.
No art. 146, I, “b”, está definido que ‘cabe a lei complementar estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre prescrição e decadência tributárias”.
São princípios e normas de índole fundamental, dizentes com a prescrição, aplicáveis a todos os ramos do direito.
Significa dizer que, tanto a pretensão de aplicar a pena quanto a de executá-la deve ter tempo certo para ocorrer.
O Código Civil estabelece que, “violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição...” (Art. 189).


Ademais, encontra-se em vigor, a Lei Federal n° 9.873/1999, estabelecendo prazo de prescrição para o exercício de ação punitiva, restringindo sua aplicação, no entanto, à Administração Federal.
Não há, entretanto, norma expressa, de caráter jurígeno, dispondo sobre a prescrição no âmbito da legislação de trânsito.

A Resolução n° 182/2005, define, em seus arts. 22 e 23 a prescrição em relação a suspensão e a cassação do direito de dirigir.
É um equívoco definir prazo prescricional em norma como a Resolução Administrativa. Esse ato existe para definir procedimentos ao cumprimento de uma norma de direito, podendo, excepcionalmente, servir de regulamento. Por ser assim, não pode ir além ou aquém do campo de aplicação material da lei. Isto é, não pode criar e nem extinguir direito. Essa possibilidade é reservada aquelas normas submetidas ao processo legislativo, como é o caso, inclusive, da Resolução Legislativa prevista no art. 56, VII, da Constituição Federal.
A positivação do direito nacional decorre da soberania. A soberania pertence ao povo e só a ele (Jean Jacques Rousseau). E foi com essa máxima Rousseauniana que a Constituição Federal, aclamada como Constituição Cidadã, foi elaborada.

A Carta Magna estabelece, em seu art. 1°, caput e Inciso I que “a República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos (...) a soberania”
No parágrafo único do art. 1° citado está consignado que “todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.

O art. 51, inciso II define que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”.

Assim, os membros das casas legislativas, com base nos pressupostos fundamentais elencados alhures, estão aptos a implementar o processo legislativo, contando com a participação do Poder Executivo, para sanção ou veto.
O processo legislativo está definido no art. 59, incisos I a VII, compreendendo a elaboração de emendas à Constituição, leis complementares, leis ordinárias, leis delegadas, medidas provisórias, decretos legislativos e resoluções.

A resolução prevista no art. 59 da CF é resolução legislativa, aprovada pelos plenários das Casas Legislativas, normalmente utilizadas para normatizar questões interna corporis.
Uma resolução administrativa – sem submissão ao processo legislativo - ou um parecer jurídico, podem interpretar as normas e reconhecer um prazo prescricional, jamais estabelecê-lo.
Portanto, hodiernamente, não existe norma de direito estabelecendo prazo prescricional específica para a aplicação e execução das infrações de trânsito.

Entretanto, o ordenamento jurídico pátrio não contempla a possibilidade de penas perpétuas, privilegiando sempre a reabilitação.

Segundo essa lógica, não pode o Poder Público perseguir ou punir, ad perpetuam rei memoriam, os administrados. Não se trata de conclamação à impunidade, mas de punições proporcionais e razoáveis, inclusive quanto ao prazo para aplicação.
Assim, ainda que não haja disposição expressa em norma de direito, de prazo prescricional para as sanções de trânsito, o silêncio da lei deve ser suprido e o prazo prescricional reconhecido.

“STF já decidiu que as sanções administrativas se sujeitam á prescrição e, à míngua de norma expressa reguladora da matéria na Lei nº 4.595/64, é de se reconhecer a validade da aplicação, por analogia, da regra prescricional contida no art. 28 da Lei nº 8.884/94, vigente à época do fato para regular o prazo prescricional da falta praticada pelo recorrido.

Os princípios da legalidade e da isonomia foram observados no caso em exame. Possível é a integração para reconhecer a validade da aplicação por analogia do prazo prescricional de cinco anos assinalado ao art. 28 da Lei nº 8.884/94 às infrações previstas pela Lei nº 4.595/64 (...).
Nessa linha de raciocínio, preleciona o saudoso mestre Hely Lopes Meirelles que, "quando a lei não fixa o prazo da prescrição administrativa,esta deve ocorrer em cinco anos, à semelhança da prescrição das ações pessoais contra a Fazenda Pública (Dec. 20.910/32), das punições dos profissionais liberais (Lei 6.838/80) e para cobrança do crédito tributário(CTN, art. 174)" ("Direito Administrativo Brasileiro", São Paulo: Malheiros ditores, 2003, p. 654).
(...)
O ilustre professor Celso Antônio Bandeira de Mello, ao discorrer acerca das prescrição das ações judiciais contra o administrado, assevera que, na ausência de especificação legal do prazo, "correto não é a analogia com o direito civil, posto que (sic), sendo as razões que o informam tão distintas das que inspiram as relações de Direito Público, nem mesmo em tema de prescrição caberia buscar inspiração em tal fonte. Antes, dever-se-á, pois, indagar do tratamento atribuído ao tema prescricional ou decadencial em regras genéricas de Direito Público. Nestes encontram-se duas orientações com tal caráter: a) a relativa à prescrição em casos inversos, isto é, prescrição de ações do administrado contra o Poder Público. (...); b) a concernente ao prazo de prescrição para o Poder Público cobrar débitos tributários ou decadencial para constituir o crédito tributário" (in "Curso de Direito Administrativo", São Paulo: Malheiros Editores, 2003, p. 906/907).
E conclui o renomado autor:

"Vê-se, pois, que este prazo de cinco anos é uma constante nas disposições gerais estatuídas em regras de Direito Público, quer quando reportadas ao prazo para o administrado agir, quer quando reportadas ao prazo para a Administração fulminar seus próprios atos. Ademais, salvo disposição legal explícita, não haveria razão prestante para distinguir entre Administração e administrados no que concerne ao prazo ao cabo do qual faleceria o direito de reciprocamente proporem ações" (in "Curso de Direito Administrativo", São Paulo: Malheiros Editores, 2003, p. 907). (Excerto do voto do eminente Ministro do STJ - Francisco Falcão no REsp Nº 758.386 – DF)

Portanto, o preenchimento da lacuna quanto a prescrição relativa as infrações de trânsito deve ser feito com o reconhecimento da validade do Decreto 20.910/32, conformado pelo Decreto-lei n° 4.597/42, que estabelece o prazo prescricional das dívidas passivas do Poder Público.

O Decreto 20.910/32, c/c as disposições do Decreto-lei n° 4.597/42, estabelece o prazo prescricional de 05 (cinco) anos para a cobrança das dívidas passivas dos órgãos do Poder Público, devendo ser aplicado também para a cobrança da dívida ativa de natureza administrativa não tributária.
Essa orientação provém das decisões judiciais mais recentes e das considerações doutrinárias, conforme já assentado, e no seguinte julgado egrégio Superior Tribunal de Justiça – STJ.

Os principais fundamentos da orientação jurisprudencial são os seguintes:

Se a relação que deu origem ao crédito em cobrança tem assento no Direito Público, não tem aplicação a prescrição constante do Código Civil.
Uma vez que a exigência dos valores cobrados a título de multa tem nascedouro num vínculo de natureza administrativa, não representando, por isso, a exigência de crédito tributário, afasta-se do tratamento da matéria a disciplina jurídica do CTN.
A cobrança da multa de natureza administrativa está sujeita a Incidência do Decreto 20.910/32, porque à Administração Pública, na cobrança de seus créditos, deve-se impor a mesma restrição aplicada ao administrado no que se refere às dívidas passivas daquela.
Aplica-se, no caso, o princípio da igualdade, corolário do princípio da simetria.
Essa orientação jurisprudencial tem origem no julgamento proferido pelo STJ no Recurso Especial nº 623.023 - RJ (2004/0011071-9), tendo como Relatora a eminente Ministra Eliana Calmon, julgado em 14/03/2006.
A eminente Relatora consignou em seu voto que “não tem aplicação à hipótese dos autos a prescrição constante do Código Civil, porque a relação de direito material que deu origem ao crédito em cobrança foi uma relação de Direito Público, em que o Estado, com o seu jus imperii, impôs ao administrado multa por infração”.
Afasta-se também do tratamento da matéria a disciplina jurídica do CTN, porquanto não se questiona, in casu, o pagamento de crédito tributário, mas de valores cobrados a título de multa, sanção pecuniária de natureza eminentemente administrativa.
O que não se deve olvidar, na busca de uma solução adequada para a resolução do impasse, é a existência do Decreto 20.910, de 06 de janeiro de 1932, que, no seu art. 1º, contém a seguinte disposição:
Art. 1º. As dívidas passivas da União, dos Estados e dos Municípios, bem assim todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda Federal, Estadual ou Municipal, seja qual for a sua natureza, prescrevem em cinco anos contados da data do ato ou fato do que se originarem.
O dispositivo, perceba-se, trata da prescrição para as dívidas passivas da União, dos Estados e dos Municípios, fixando em cinco anos o prazo para que os administrados exerçam o direito de ação em desfavor da Fazenda Pública.
Reconheço que o mencionado artigo não faz referência à dívida ativa daqueles entes públicos, todavia entendo que, por aplicação do princípio da igualdade, corolário do princípio da simetria, deve-se impor à Administração Pública a mesma restrição para a cobrança de seus créditos.
Penso então que, na ausência de definição legal específica, o prazo prescricional para a cobrança da multa, crédito de natureza administrativa, deve ser fixado em cinco anos, não podendo a União, o Estado ou o Município gozar de tratamento diferenciado em relação ao administrado, porquanto não se verifica, nesse entendimento, risco de prejuízo ao interesse público.
A propósito, a Primeira Seção desta Corte, no julgamento do REsp 380.006/RS, de Relatoria do Min. Peçanha Martins, já se posicionou no sentido de que a prescrição administrativa opera-se com o decurso do prazo de cinco anos. Questionava-se, então, a cobrança de multa imposta pelo BACEN por infração cambial ocorrida há mais de dez anos da data do ajuizamento da ação.
Naquela oportunidade, não só o disposto no art. 1º do Decreto 20.910/32 serviu de fundamento para a decisão, mas também o art. 174 do CTN e o teor do art. 1º da Lei 9.873/99, de seguinte redação:
Art. 1º. Prescreve em cinco anos a ação punitiva da Administração Pública Federal, direta e indireta, no exercício do poder de polícia, objetivando apurar infração à legislação em vigor, contados da data da prática do ato ou, no caso de infração permanente ou continuada, do dia em que tiver cessado.
Portanto, entendo não merecer reparo a conclusão do TJ/RJ, mesmo que se tenha fundamentado o acórdão em disposição do CTN.”
Além de Reconhecer o prazo prescricional de cinco anos, o egrégio Superior Tribunal de Justiça também definiu que o marco inicial para a cobrança da multa administrativa é a data da prática do ato ou, no caso de infração permanente ou continuada, do dia em que tiver cessado.


Em relação à multa administrativa de trânsito, não pode haver dúvidas que o marco inicial é a data da prática do ato, tendo em vista que o Código de Trânsito Brasileiro privilegia a autuação em flagrante, consoante as normas do seu Art. 280, incisos e parágrafos.
Concluímos, pois, que o prazo prescricional para aplicação e execução das sanções administrativas de trânsito por parte do Poder Público é de cinco anos contados da data da ocorrência do fato, sendo este o mesmo prazo para a cobrança da dívida passiva dos entes estatais previsto no Decreto 20.910/32, c/c as disposições do Decreto-lei n° 4.597/42, em atenção ao princípio da igualdade, corolário do princípio da simetria.
É mister consignar, por derradeiro, que opera-se a suspensão do prazo prescricional durante a tramitação de recurso administrativo relativo à infração de trânsito.
É o parecer que submeto à superior apreciação do Plenário deste egrégio Conselho Estadual de Trânsito – CETRAN/SC.
Florianópolis, 12 de junho de 2006
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LUIZ ANTONIO DE SOUZA
Relator

Aprovado por unanimidade na Sessão Ordinária n° 022/2006, realizada em 20 de junho de 2006.
LUIZ ANTONIO DE SOUZA
Presidente
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