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quinta-feira, 8 de novembro de 2012

CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE VEÍCULO

STJ - CONSUMIDOR. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE VEÍCULO. BEM ESCOLHIDO PELO CONSUMIDOR. DEFEITO NO PRODUTO. VÍCIO REDIBITÓRIO. INEXISTÊNCIA DE RESPONSABILIDADE DO BANCO FINANCIADOR. RESPONSABILIDADE DO FORNECEDOR. CONTRATO ACESSÓRIO. CONSIDERAÇõES NO VOTO VENCIDO DO MIN. LUIS FELIPE SALOMÃO ENTENDENDO HAVER PARCERIA ENTRE O BANCO E O VENDEDOR DO VEÍCULO E RESCINDIA O CONTRATO DE FINANCIAMENTO JUNTO COM O CONTRATO DE COMPRA E VENDA EM FACE ENTRE OUTROS FUNDAMENTOS NA FUNÇÃO SOCIAL DO CONTRATO E NA BOA-FÉ OBJETIVA. CDC, ART. 18. DEC.-LEI 911/69. CCB/2002, ARTS. 421, 422 E 441.

«... VOTO VENCIDO. 2.2 – Quanto ao mérito do recurso, a autora adquiriu veículo automotor para desenvolver sua atividade junto a uma sorveteria. Pagou R$ 2.000,00 (dois mil reais) como «entrada» à concessionária Jales Veículos e financiou os R$ 14.000,00 (quatorze mil reais) restantes perante o ora recorrente, o Banco Itaú. Na data do ajuizamento da ação - 28 de outubro de 2004 -, havia quitado dez prestações, num total de R$ 6.926,40 (seis mil, novecentos e vinte e seis reais e quarenta centavos), correspondentes a praticamente 50% do valor financiado.

É incontroverso que o automóvel veio a apresentar vícios redibitórios que o tornaram imprestável para o fim a que se destinava, o que gerou inclusive a paralisação das atividades da sorveteria.

Insiste o Banco na tese de que os negócios jurídicos celebrados pela autora foram independentes e pleiteia a manutenção do contrato de financiamento.

Como bem observou o Juiz singular, houve nítida parceria entre o Banco e a concessionária quando celebraram os contratos com a ora recorrida, pois, na hipótese, «o consumidor apenas negocia com o fornecedor do produto de seu interesse, o qual lhe dá a opção de realizar um financiamento para a compra do bem ali mesmo, em seu estabelecimento comercial» (fls. 235-236).

Também ficou ressaltado na sentença que situação diversa seria se a autora fosse pessoalmente ao Banco para contrair empréstimo e, com o dinheiro obtido, pagasse o carro à vista e arcasse com os custos do mútuo de maneira independente.

Por isso, prossegue a sentença, na primeira hipótese, «o fornecedor do produto e a instituição bancária e financeira (fornecedora de serviços) atuam em evidente parceria e, portanto, respondem de forma solidária pelos prejuízos eventualmente ocasionados suportados pelos consumidores que negociaram com ambas».. E completou:

«No caso presente, os dois contratos – compra e venda e financiamento – são interdependentes, ou seja, não haveria o contrato de compra e venda do automóvel se não fosse o crédito obtido com o financiamento bancário». (fl. 236).

O acórdão do Tribunal de origem segue a mesma linha:

«Dessa forma, a nulidade do contrato de compra e venda implica a insubsistência do contrato de financiamento, pois o objeto daquele é garantia de realização deste»..

Para se rever a premissa fixada pelas instâncias ordinárias segundo a qual os contratos foram celebrados de maneira vinculada, seria necessário revolver o conjunto fático-probatório dos autos, o que é vedado pela Súmula 7/STJ, do seguinte teor:

«A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial».

Embora o contrato de mútuo possa ser realizado de modo independente, como no exemplo apresentado pela sentença – e aí, sim, descaberia cogitar de interligação entre os contratos –, o fato é que se mostra inegável, no caso dos autos, a interdependência entre eles.

O contrato de compra e venda é sempre principal, como adverte Carlos Roberto Gonçalves ao classificar os contratos à fl. 82 do livro anteriormente mencionado:

«A presente classificação toma como ponto de partida o fato de que alguns contratos dependem, lógica e juridicamente, de outro como premissa indispensável. Os contratos dos quais dependem chamam-se principais. Contratos principais são os que têm existência própria, autônoma e não dependem, pois, de qualquer outro, como a compra e venda e a locação»..

2.3 - Ainda que assim não se entenda, também pelo ângulo jurídico, não pode prevalecer o voto do eminente Relator, com a devida vênia. A autora adquiriu um veículo que apresentou vícios redibitórios – repita-se, fato incontroverso – e, após tentar por diversas vezes resolver o problema junto à concessionária, sem lograr êxito, devolveu o carro à referida empresa e buscou rescindir os contratos de compra e venda e de financiamento.

O Código de Defesa do Consumidor, ao tratar dos vícios do produto, veio a ampliar as garantias do Código Civil, pois, além de considerar vícios redibitórios tanto os defeitos ocultos, como também os aparentes ou de fácil constatação, possibilitou não só o ajuizamento das ações edilícias, mas também autorizou ao consumidor a possibilidade de pleitear a substituição do produto – e, não havendo outro daquela mesma espécie, marca ou modelo, por outro com complementação ou restituição de diferença de preço –, a devolução da quantia paga ou o abatimento proporcional do preço. Confira-se:

«Art. 18. Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com as indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas.

§ 1º Não sendo o vício sanado no prazo máximo de trinta dias, pode o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha:

I - a substituição do produto por outro da mesma espécie, em perfeitas condições de uso;

II - a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos;

III - o abatimento proporcional do preço».

No caso dos autos, a autora adquiriu o veículo da concessionária e transferiu, no mesmo momento, a propriedade ao Banco, em alienação fiduciária, até que viesse a quitar as parcelas de financiamento.

Se se entender que os contratos firmados são desvinculados entre si, impedindo-se a rescisão do financiamento, chega-se à absurda conclusão de que só resta à autora conviver com os vícios redibitórios. É que, não contando a autora com a propriedade do automóvel – já que existe propriedade fiduciária do Banco –, não estaria ela sequer protegida pelas normas do Código Civil (artigos 441 e 442).

A prevalecer o raciocínio do eminente Relator, a autora não poderia sequer pleitear a rescisão do contrato de compra e venda ante os vícios redibitórios, pois não não seria possível devolver o bem à concessionária, e, se o fizesse, correria o risco de ver decretada sua prisão civil. Nem poderia requerer o abatimento do preço, porquanto o único valor que pagou à concessionária foi relativo à entrada – de R$2.000,00 –, sendo que o valor principal, de R$14.000,00, foi financiado pelo Banco. Muito menos poderia pedir a substituição do produto, porque este não está na esfera de seu patrimônio desde o momento da aquisição, adquirido mediante financiamento em alienação fiduciária.

Por conseguinte, a conduta dos réus fere a boa-fé objetiva e a função social dos contratos na hipótese, retirando do consumidor a possibilidade de reclamar de vícios redibitórios, o que transcende, até mesmo, o fato de serem os contratos conexos ou não.

Caio Mário da Silva Pereira, em «Instituições de Direito Civil», volume III, pgs. 13-14, ensina que a função social do contrato serve precipuamente para restringir a autonomia da vontade quando esteja em confronto com o interesse social e este deva prevalecer. Assim, desafia-se a concepção clássica de que os contratantes tudo podem fazer em face da autonomia da vontade.

Segundo Carlos Roberto Gonçalves, na obra citada, pgs. 6-9:

«É possível afirmar que o atendimento à função social pode ser enfocado sob dois aspectos: um, individual, relativo aos contratantes, que se valem do contrato para satisfazer seus interesses próprios, e outro, público, que é o interesse da coletividade sobre o contrato. Nessa medida, a função social do contrato somente estará cumprida quando a sua finalidade – distribuição de riquezas – for atingida de forma justa, ou seja, quando o contrato representar uma fonte de equilíbrio social.

Observa-se que as principais mudanças no âmbito dos contratos, no novo diploma, foram implementadas por cláusulas gerais, em paralelo às normas marcadas pela estrita casuística. Cláusulas gerais são normas orientadoras sob forma de diretrizes, dirigidas precipuamente ao juiz, vinculando-o, ao mesmo tempo em que lhe dão liberdade para decidir. São elas formulações contidas na lei, de caráter significativamente genérico e abstrato, cujos valores devem ser preenchidos pelo juiz, autorizado para assim agir em decorrência da formulação legal da própria cláusula geral (...).

As cláusulas gerais resultaram basicamente do convencimento do legislador de que as leis rígidas, definidoras de tudo e para todos os casos, são necessariamente insuficientes e levam seguidamente a situações de grave injustiça. Embora tenham, num primeiro momento, gerado certa insegurança, convivem, no entanto, harmonicamente no sistema jurídico, respeitados os princípios constitucionais concernentes à organização jurídica e econômica da sociedade. Cabe à doutrina e à jurisprudência identificá-las ao caso concreto, de acordo com as suas circunstâncias, como novos princípios de direto contratual e não simplesmente como meros conselhos, destituídos de força vinculante, malgrado isso possa significar uma multiplicidade de soluções para uma mesma situação basicamente semelhante, mas cada uma com particularidades que impõem solução apropriada, embora diferente da outra.

Cabe destacar, dentre outras, a cláusula geral que proclama a função social do contrato, ora em estudo, e a que exige um comportamento condizente com a probidade e boa-fé objetiva»..

Na obra «Direitos Reais»., Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald afirmam no tópico relativo à propriedade fiduciária:

«O objetivo da propriedade fiduciária é garantir uma obrigação assumida pelo alienante, em prol do adquirente. O credor fiduciário converte-se automaticamente em proprietário, tendo no valor do bem dado em garantia o eventual numerário para satisfazer-se na hipótese de inadimplemento do débito pelo devedor fiduciante.

Diversamente ao que ocorria na origem romana do instituto, no Código Civil não será a confiança (fidúcia) que determinará o retorno da propriedade ao devedor, mas a própria cláusula inserida no negócio jurídico originário, que impõe a obrigação de o credor restituir a coisa ao tempo do adimplemento. Por isso, o art. 1.361, «caput», do Código Civil é explícito ao enaltecer a precípua função de garantia da propriedade fiduciária.

Aliás, a confiança é a base e substrato de qualquer relação obrigacional em sua concepção finalista de processo. Ou seja, o negócio jurídico de alienação fiduciária é um conjunto de atos coordenados que, desde a fase pré-contratual (tratativas) até a fase pós-contratual, requer que os contratantes atuem com lealdade e cooperação, concretizadas pelo princípio da boa-fé objetiva (art. 422 do CC)».

A autora, desde o início, agiu com boa-fé objetiva. Tanto que, mesmo após devolver o veículo, continuou pagando as parcelas de financiamento do bem.

O mesmo não se pode dizer acerca da conduta da instituição financeira. Constatados os vícios redibitórios que tornaram o bem imprestável, alega o Banco que os negócios jurídicos firmados pela adquirente do veículo são distintos, de modo a impossibilitar a rescisão do contrato de financiamento. A autora – que, repita-se, celebrou os dois contratos na mesma ocasião, como ressaltado na sentença –, a prevalecer o voto do eminente Relator, está impedida de desfazer-se de um bem que não serviu para o fim a que se destinava, o que frustrou sua legítima expectativa acerca de ambos os negócios realizados.

Mais adiante, afirma o Relator:

«É certo que as disposições do Código de Defesa do Consumidor asseguram a rescisão contratual na hipótese em que haja vício redibitório. Mas é evidente que, se o comprador já se desfez do bem, nada mais tem a reclamar que não perdas e danos contra quem lhe forneceu o bem, na forma que autoriza o Código Civil»..

Em uma penada, o que propõe o voto proferido é a negativa de vigência do artigo 18 do CDC, como se não existisse o dispositivo no ordenamento pátrio.

É dizer, o consumidor que adquire um veículo e o financia, se este apresentar defeito, nada nem a ninguém poderá reclamar.

Em assim sendo, poder-se-ia cogitar também em violação ao princípio da transparência e ao direito de informação, norteadores das relações regidas pelo CDC, pois, na pior das hipóteses, a consumidora, ante a sua indiscutível vulnerabilidade, deveria no mínimo ser advertida de tamanho risco, a fim de decidir se valeria ou não à pena celebrar o negócio jurídico que não viria a acobertar, em momento algum, eventuais vícios redibitórios, em face da alienação fiduciária dada em garantia no mesmo ato da compra e venda do automóvel.

Então, o Banco tem a garantia de receber o bem de volta em caso de inadimplemento das prestações, mas a autora não pode reclamar de vícios do produto no prazo conferido pela lei, o que ofende também o princípio da isonomia entre as partes.

Confiram-se os seguintes precedentes desta Corte a respeito da necessidade de observação dos princípios da boa-fé objetiva, transparência, isonomia e função social dos contratos:

«DIREITO CIVIL E CONSUMIDOR. SEGURO SAÚDE. CONTRATAÇÃO ANTERIOR À VIGÊNCIA DO CDC E À LEI 9.656/98. EXISTÊNCIA DE TRATO SUCESSIVO. INCIDÊNCIA DO CDC, MAS NÃO DA LEI 9.656/98. BOA-FÉ OBJETIVA. PRÓTESE NECESSÁRIA À CIRURGIA DE ANGIOPLASTIA. ILEGALIDADE DA EXCLUSÃO DE «STENTS». DA COBERTURA SECURITÁRIA. DANO MORAL CONFIGURADO. DEVER DE REPARAR OS DANOS MATERIAIS.

(...)

- A cláusula geral de boa-fé objetiva, implícita em nosso ordenamento antes da vigência do CDC e do CC/2002, mas explicitada a partir desses marcos legislativos, impõe deveres de conduta leal aos contratantes e funciona como um limite ao exercício abusivo de direitos.

- O direito subjetivo assegurado em contrato não pode ser exercido de forma a subtrair do negócio sua finalidade precípua (...)

Recurso especial a que se dá parcial provimento» (REsp 735.168/RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, DJ de 26.03.2008).

«PROCESSUAL CIVIL, ADMINISTRATIVO E TRIBUTÁRIO. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. DEFICIÊNCIA NA FUNDAMENTAÇÃO. COBRANÇA DO PIS E DA COFINS NA FATURA TELEFÔNICA. ILEGITIMIDADE DA ANATEL. ACRÉSCIMO NA TARIFA. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. PRÁTICA ABUSIVA CONFIGURADA. CDC. OFENSA. JUROS DE MORA. INAPLICABILIDADE DO ART. 167 DO CTN. NATUREZA NÃO-TRIBUTÁRIA.

(...)

9. O repasse indevido do PIS e da COFINS na fatura telefônica configura «prática abusiva». das concessionárias, nos termos do Código de Defesa do Consumidor, pois viola os princípios da boa-fé objetiva e da transparência, valendo-se da «fraqueza ou ignorância do consumidor» (art. 39, IV, do CDC).

(...)

11. Recurso Especial não provido» (REsp 1.053.778/RS, Rel. Min. Herman Benjamin, DJ de 30.09.2008).

«RECURSO ESPECIAL. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. DISTRATO. DEVOLUÇÃO DOS VALORES NA FORMA DE CARTA DE CRÉDITO. UTILIZAÇÃO PARA A AQUISIÇÃO DE OUTRO IMÓVEL NA MESMA CONSTRUTORA. ART. 53, «caput», C/C ART. 51, II, DO CDC. RECURSO NÃO CONHECIDO.

1. A análise da abusividade da cláusula de decaimento «é feita tanto frente ao direito tradicional e suas noções de abuso de direito e enriquecimento ilícito, quanto frente ao direito atual, posterior à entrada em vigor do CDC, tendo em vista a natureza especial dos contratos perante os consumidores e a imposição de um novo paradigma de boa-fé objetiva, eqüidade contratual e proibição da vantagem excessiva nos contratos de consumo (art. 51, IV) e a expressa proibição de tal tipo de cláusula no art. 53 do CDC».

(...)

3. Recurso especial não conhecido» (REsp 437.607/PR, Rel. Min. Hélio Quaglia Barbosa, DJ de 04.06.2007).

«Civil. Recurso especial. Contrato de compra e venda de imóvel regido pelo Código de Defesa do Consumidor. Referência à área do imóvel. Diferença entre a área referida e a área real do bem inferior a um vigésimo (5%) da extensão total enunciada. Caracterização como venda por corpo certo. Isenção da responsabilidade do vendedor. Impossibilidade. Interpretação favorável ao consumidor. Venda por medida. Má-fé. Abuso do poder econômico. Equilíbrio contratual. Boa-fé objetiva.

(...)

- Somente a preponderância da boa-fé objetiva é capaz de materializar o equilíbrio ou justiça contratual.

Recurso especial conhecido e provido» (REsp 436.853/DF, Rel. Min. Nancy Andrighi, DJ de 27.11.2006).

«Civil e processo civil. Recurso especial. Embargos de declaração rejeitados. Ausência de hipótese de cabimento. Efeitos da hipoteca. Terceiro adquirente. Cláusula expressa no compromisso de compra e venda. Boa-fé objetiva.

(...)

- Tem aplicação o princípio da boa-fé objetiva em razão da fundada expectativa por parte do terceiro adquirente de que o imóvel não estava gravado com ônus algum.

Recurso especial não conhecido» (REsp 591.917/GO, Rel. Min. Nancy Andrighi, DJ de 1º.02.2005).

«Direito do consumidor. Contrato de seguro de vida inserido em contrato de plano de saúde. Falecimento da segurada. Recebimento da quantia acordada. Operadora do plano de saúde. Legitimidade passiva para a causa. Princípio da boa-fé objetiva. Quebra de confiança. Denunciação da lide. Fundamentos inatacados. Direitos básicos do consumidor de acesso à Justiça e de facilitação da defesa de seus direitos. Valor da indenização a título de danos morais. Ausência de exagero. Litigância de má-fé. Reexame de provas.

- Os princípios da boa-fé e da confiança protegem as expectativas do consumidor a respeito do contrato de consumo.

- A operadora de plano de saúde, não obstante figurar como estipulante no contrato de seguro de vida inserido no contrato de plano de saúde, responde pelo pagamento da quantia acordada para a hipótese de falecimento do segurado se criou, no segurado e nos beneficiários do seguro, a legítima expectativa de ela, operadora, ser responsável por esse pagamento.

(...)

Recurso especial não conhecido» (REsp 590.336/SC, Rel. Min. Nancy Andrighi, DJ de 21.02.2005).

«Recurso Especial. Processual Civil. Instituição bancária. Exibição de documentos. Custo de localização e reprodução dos documentos. Ônus do pagamento.

- O dever de informação e, por conseguinte, o de exibir a documentação que a contenha é obrigação decorrente de lei, de integração contratual compulsória. Não pode ser objeto de recusa nem de condicionantes, face ao princípio da boa-fé objetiva (...) «(REsp 330.261/SC, Rel. Min. Nancy Andrighi, DJ de 08.04.2002).

«RECURSO ESPECIAL.. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. IMPUGNAÇÃO EXCLUSIVAMENTE AOS DISPOSITIVOS DE DIREITO MATERIAL. POSSIBILIDADE. FRACIONAMENTO DE HIPOTECA. ART. 1488 DO CC/02. APLICABILIDADE AOS CONTRATOS EM CURSO. INTELIGÊNCIA DO ART. 2035 DO CC/02. APLICAÇÃO DO PRINCIPIO DA FUNÇÃO SOCIAL DOS CONTRATOS.

(...)

- O art. 1488 do CC/02, que regula a possibilidade de fracionamento de hipoteca, consubstancia uma das hipóteses de materialização do princípio da função social dos contratos, aplicando-se, portanto, imediatamente às relações jurídicas em curso, nos termos do art. 2035 do CC/02.

(...)

- Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, provido» (REsp 691.738/SC, Rel. Min. Nancy Andrighi, DJ de 26.09.2005).

«ADMINISTRATIVO – SERVIÇO DE TELEFONIA – FALTA DE PAGAMENTO – BLOQUEIO PARCIAL DAS LINHAS DA PREFEITURA – MUNICÍPIO COMO CONSUMIDOR.

(...)

3. A continuidade do serviço, sem o efetivo pagamento, quebra o princípio da isonomia e ocasiona o enriquecimento sem causa de uma das partes, repudiado pelo Direito (interpretação conjunta dos arts. 42 e 71 do CDC).

(...)

5. Recurso especial provido» (REsp 742.640/MG, Rel. Min. Eliana Calmon, DJ de 26.09.2007).

2.4 - O acórdão recorrido apresentou a melhor exegese para os artigos 14, § 3º, e 18 do CDC.

Não há falar-se, portanto, em qualquer violação aos artigos apontados como violados nas razões do especial. Ao revés, negar a proteção ao consumidor, no caso concreto, poderá acarretar lesão direta aos artigos 5º, XXXII, e 170, V, da Constituição Federal.

2.5 - Do mesmo modo, não prospera a alegação do Banco de que o contrato de financiamento não deve ser rescindido ao argumento de que não foi fornecedor do produto defeituoso. Ora, o que importa é que a instituição financeira, em parceria com a concessionária, foi fornecedora do serviço de concessão de crédito, sendo que a autora corretamente pleiteou lucros cessantes, danos emergentes e danos morais apenas no que diz respeito à concessionária.

De fato, o vício do produto tem o condão de gerar a rescisão de ambos os contratos. Isso não significa dizer que o Banco irá responder pelo vício em si – tanto que somente a concessionária foi condenada em lucros cessantes, danos emergentes e morais –, mas implica asseverar que o defeito contaminou o contrato de compra e venda – principal – e, por conseguinte, os que lhe são conexos – na hipótese, o de financiamento bancário, ante as peculiaridades do caso concreto.

2.6 - Por fim, ainda que superada a forma de interpretação do artigo 18 do CDC, transcendendo a questão relativa à interdependência entre os contratos de compra e venda e de financiamento, concluo que, de qualquer maneira, não houve a boa-fé objetiva das partes que contrataram com a autora, nem a observância da função social dos contratos, motivos que, por si sós, são suficientes para a rescisão de qualquer contrato.

Por outro lado, não foram observados também os princípios da transparência e da isonomia que devem nortear as relações de consumo.

2.7 - No caso dos autos, os valores do financiamento foram repassados diretamente à concessionária, por isso é improcedente também o pedido alternativo formulado nas razões do especial, segundo o qual, na hipótese de se entender pela rescisão do contrato de mútuo, a recorrida deve restituir o crédito que nem chegou a receber. Não há falar-se em enriquecimento sem causa da recorrida. Ao Banco compete, se for o caso, adotar as providências pertinentes no que diz respeito à concessionária.

3 - Em resumo, o especial não deve ser conhecido pelos seguintes motivos:

3.1 - O CDC é aplicável aos contratos firmados pela autora, em toda sua extensão, não cabendo a restrição pretendida pelo eminente Relator;

3.2 - Para se rever a premissa fixada pelas instâncias ordinárias segundo a qual os contratos foram celebrados de maneira vinculada, seria necessário revolver o conjunto fático-probatório dos autos, o que é vedado pela Súmula 7/STJ;

3.3 - Aplica-se o artigo 18 do CDC aos contratos firmados pela autora, preceito que estabelece:

«Art. 18. Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com as indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas.

§ 1º Não sendo o vício sanado no prazo máximo de trinta dias, pode o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha:

I - a substituição do produto por outro da mesma espécie, em perfeitas condições de uso;

II - a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos;

III - o abatimento proporcional do preço»;

3.4 - Obstar a rescisão do contrato de financiamento é compelir a consumidora a conviver com os vícios redibitórios, o que fere os princípios da boa-fé objetiva e da função social dos contratos;

3.5 - Há também violação ao princípio da transparência e ao direito de informação, pois, na pior das hipóteses, a consumidora, ante sua indiscutível vulnerabilidade, deveria ser advertida de tamanho risco de adquirir veículo que não viesse em momento algum a acobertar vícios redibitórios, em face da alienação dada em garantia no mesmo ato da compra e venda do automóvel;

3.6 - Constata-se ofensa ao princípio da isonomia entre as partes, pois o Banco teria a garantia de receber o bem de volta em caso de inadimplemento das prestações, mas a consumidora não pode reclamar de vícios do produto no prazo conferido pela lei;

3.7 - Negar a proteção ao consumidor poderá acarretar lesão direta aos artigos 5º, XXXII, e 170, V, da Constituição Federal;

3.8 - O vício do produto contaminou o contrato de compra e venda - principal - e o de financiamento, por lhe ser conexo. Isso não significa que o Banco irá responder pelo vício em si, tanto que somente a concessionária foi condenada em lucros cessantes, danos emergentes e morais;

3.9 - Os valores do financiamento foram repassados diretamente à concessionária, mostrando-se improcedente o pedido alternativo de devolução, pela recorrida, de valores que nem chegou a receber, cabendo ao Banco, se for o caso, adotar as providências pertinentes no que diz respeito à concessionária.

4 - Ante o exposto, pedindo vênia mais uma vez ao eminente Relator, o Ministro João Otávio de Noronha, não conheço do recurso especial. ...» (Min. Luis Felipe Salomão).»
(STJ - Rec. Esp. 1.014.547 - DF - Rel.: Min. João Otávio de Noronha - J. em 25/08/2009 - DJ 07/12/2009- Doc. LEGJUR 113.0391.1000.1600)


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